domingo, 30 de março de 2014


Estávamos no ano de 1966.
A revolução, ainda, estava quente. Nesse verão, os dias e as noites sucediam-se em tertúlias sobre variados temas e a euforia de se querer viver tudo de uma só vez levava-nos ao impossível. O amor despertava em nossos adolescentes corpos que fervilhavam ao mais leve toque. E foi numa dessas noites  - já os copos  se haviam esvaziado e os nossos sentidos estavam inebriados e desinibidos – que a descoberta se fez. Dias, semanas, talvez um ou dois anos e a vida estudantil acabou. O regresso a casa naquele comboio que subia e descia socalcos deixava para trás a paisagem citadina levando-me a uma miragem verde e florida de uma aldeia , quase esquecida no meio do nada. Fechei o livro e concentrei-me naquela janela que salpicava de vez em quando quadros campestres há muito escondidos na minha memória. O coração partido de amor logo se colou e palpitou. Esquecera por algum tempo os anos passados e relembrei outros, ainda, mais longínquos: a ida para a escola – através dos carreiros – em dias de chuva, em dias de frio, em dias de sol. A merenda, no saquinho de linho, numa mão e a sacola dos livros na outra, a espera  e o encontros dos seis rapazes que me acompanhavam, todos os dias e lá mais à frente a Maria Rita juntava-se-nos e lá íamos.
Que pureza! É aqui que eu vou ficar.
O comboio começou a abrandar e parou na estação cheia de hortênsias – as mesmas – e eu saí.

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