sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Desafio XXI:"Cemitério das palavras perdidas" 28 de fevereiro de 2014

As palavras... as palavras nasceram do namoro das letras. Namoro difícil, namoro de angústias, lamentos, de alegrias, de arremessos emotivos e diabólicos; palavras inventadas; palavras encontradas; palavras... palavras...
Quando as promessas de amor iniciam o seu percurso: usam-se as palavras; quando o mar se revolve nas dunas: usam-se as palavras; quando o céu se enternece: usam-se as palavras; quando a natureza abraça o sol e repudia o trovão: usam-se as palavras. São tantas e tão belas; são pequenas e tão grandes e são grandes e tão pequenas. No fundo estão todas elas no mais íntimo de todos nós e, esse, será o mais belo esconderijo onde se podem perder na valsa doce e amarga da mente e espreitar o cemitério onde estão guardadas e sempre prontas a sair.

Arménia Madail, in Desafios

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014


Uma brisa subiu-lhe até à cúspide do corpo.  A vida escorregava-lhe pelo corpo abaixo e abandonava-a – como a sombra que deixou pra trás esse corpo – e ficou na mais perfeita solidão.  Joana  relembrou aquela memória da juventude que, inesperadamente, lhe entrara pela vida adentro umas horas antes:  aquele respirar  ofegante -  o dia em que o beijo inocente dos seus dez anos mudou por completo  a sua vida. Casara com João : pensava em Luís!
Quando Antero - agora com dezoito anos – entrou na penumbra da sala, Joana sentiu uma culpa dolorosa. Os olhos verdes de Antero emanavam o verde daquela tarde insaciável : o passeio com Luís; o desabrochar de uma flor -  indecisa: avançar ou recuar? Este filho, de estatura atlética, de ar doce não a  deixa esquecer. A dor aperta-lhe o coração e a voz sai-lhe sumida:
-Esquece o que perguntei, filho. As violetas entontecem-me: o cheiro impregna-se na minha pele; nos meus sentidos e leva-me ao passado.
 As mãos carinhosas de Antero pousaram nos cabelos de Joana e afagaram-nos:
-        Mãe, que te atormenta? O pai já partiu há muito: lembras-te? Que segredo guarda a carta que tanto esmagas - no peito?






Estava ainda de camisa de noite, com restos de pétalas vermelhas  espalhadas pelos cabelos – a esbranquiçar – e cheiro a jasmim, quando se lembrou daqueles olhos verdejantes (a fixarem os seus) e um rio de lágrimas indubitáveis a inundar  aquele rosto esquelético – homem da sua vida.
A noite tinha-lhe sido dedicada.
À luz de um velho candelabro, deixou escorregar o vestido.
A morte iminente daquele ser tinha direito ao seu corpo decrépito, enrugado mas emanando frescura – caiu  na cama.
As mãos – outrora – brancas e esguias – hoje (ontem) trémulas acariciaram um corpo triste. O vento entrou – calado – no quarto e roubou o último suspiro.



 
 
 
Acordamos, nas ondas verdejantes, na procura da voluptuosidade, que nos dirige à brisa dos aromas e, quando, pousamos na pétala de uma qualquer flor, eis que o pólen nos embriaga com a sua fecundação de odores, sabores e sensações.








  Rasguem o peito e desabrochem para a luxúria do vosso eu. Verão o quão deleitoso é exprimir as emoções do calado AMOR que permanece na penumbra dos corações (vazados pela indiferença). A realidade sonhada é a realidade vivida






Acordei… (daquele etéreo sono)  com uma paz de espírito – será paz?- O sorriso tenta apoderar-se de mim ao mesmo tempo que o meu amor vai desaparecendo, deixando o meu corpo em descanso. Deixei de te amar. E agora?
Levanto-me decidida a não mais carpir, a não mais sentir, a não mais implorar! Quero erguer uma muralha entre mim e ti!
E caminho nas pedras rugosas da vida em direção à espuma – espuma esponjosa – que absorve todas as minhas amarguras, as minhas dúvidas, as minhas certezas incertas. Quero cair no abismo de outros braços, rebolar nas linhas curvas de outro corpo, mergulhar nas pupilas de outro olhar, inebriar-me de amor! Foi por tudo isto que o sorriso se apoderou de mim.








Porque hoje é sábado - sim, sábado – e porque amanheceu – chuvoso -  vou definhar nas recordações (inevitáveis) do ontem. Relembro os passeios pela praia, as noites de luar, os banhos de mar, os jantares no alpendre e, sobretudo, o dormir entrelaçado na rede que existia entre os dois choupos no nosso quintal! Existia! Já não existe. Arrancaste-a e eu queimei-a e com ela queimei as minhas emoções. Tudo isto é incrível! Um raio de sol rompeu o céu e entrou desastrosamente pela janela e acordei…






 

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014


Eis que me deparo com as minhas incertezas – aquelas que eu julgava terem emigrado para as margens do limbo - . Que fazer? Dei voltas e mais voltas, rodopiei junto do teu coração (queria uma vez mais cativá-lo) na certeza da incerteza de o poder arrancar do teu peito. Rasgar toda a tua pele na míngua de um pouquinho do teu amor. A carapaça endurecida e indiferente aos meus intranquilos impulsos ficou intacta num suspiráculo e eu deixei-me desvanecer…
















 
Hoje – só hoje -! Quero procurar entre a bruma o teu odor… quero saber onde está a tua outra face (aquela que escondes) , aquela que eu recordo das noites e dos dias e dos meses e dos anos que nos olhávamos e não precisávamos de falar. Aquela face – a que escondes – mas que eu teimo em querer ver! Ver…Eu intui mas não quis acreditar! Partiste e contigo foi o meu amor.










Recordo quanto tempo amei - nesse passado longínquo  - o teu singelo olhar enigmático; hoje, recordo e quero acreditar: eras um sonho; a outra face do amor. Sim, o teu corpo indelével a querer entranhar-se em mim – corpo descarnado: inerte.
A tua boca: segue procurando o impossível! As tuas pernas entrelaçadas, nas minhas, reclamam a posição excitante; a recusa constante da penetração – em sonho impossível – responde em sofrimento; a face oculta, será verdadeira?
Desfaleço finalmente (nos teus braços), deixo que me descubras – ávido de amor...
Vou, tu também, os nossos corpos colam. As entranhas sentem as gotas de suor, ouvem os gemidos, o pulsar intermitente; sonho, será isto um sonho, um desejo insuportável de algo mais – , desejo animalesco incapaz de parar – a procura total, o êxtase: este louco amor inolvidável: morreu comigo.

O amanhecer  da aldeia acorda-nos (quase sempre) com uma neblina. Esta vai-se esvanecendo deixando aparecer o Sol (inibido), trazendo com ele os melros, as poupas, os boieiros... Os cheiros da terra húmida ,elevando-se no ar, entram nas nossas narinas. O som das crianças cantarolando na ida para a escola ,faça chuva, faça sol, recordam ,todos os dias, que são horas de descer à cozinha. É na cozinha que os aromas se misturam e nos deixam entontecidos (o pão saído do forno, as compotas, a manteiga fresca) e ávidos de saborear aquelas iguarias campestres. São estas maravilhas que nos dão força. Força para arrostar o asfalto negro -  asfalto negro  que nos conduz à cidade grande (cheia de odores tão diferentes). Mas a certeza (pois pensamos sempre de modo positivo) de que voltaremos à aldeia, aos inebriantes  aromas, aos sons,  ao silêncio da natureza... enche-nos a alma. E ao fim do dia, regressamos para um novo amanhecer .



Entre a bruma, arrastei o meu corpo (ensanguentado pelos açoites) aos tropeções : as unhas enterravam-se - na terra húmida e lamacenta - sedentas de um abrigo; os cabelos desgrenhados prendiam-se nos ramos sedentos de vida. O meu correr  lento, compassado, intercalava com galopantes arremessos de fúria, ira.
Desespero, angústias, medos, alegrias, mimos e carícias jorravam das minhas entranhas embebidas de bílis. E a bruma aproximava-se, cada vez mais...no meu encalço. E as minhas pernas caíram nas teias das areias que devoravam vertiginosamente um corpo flagelado pela indiferença do HOMEM!
O GRITO fez eco, mas ninguém ouviu!


Entre as avenidas daquela cidade imponente,  seguia um  carro conduzido por um vulto que devorava com os olhos as lojas iluminadas: procurava as mais belas lojas. Aquela levou-o a uma paragem brusca: desceu, correu e entrou. Entregou um papel à balconista que imediatamente lhe deu o que tinha na gaveta; saiu. Entrou na seguinte e fez o mesmo. Depois de várias visitas  entrou no carro e conduziu-o a alta velocidade. Chegou a casa e olhando para todos os lados, correu para o seu quarto e deliciou-se com os seus haveres adquiridos: passou-lhes a mão em jeito de carícia – uma, duas, três vezes – e reconfortado guardou-os no cofre. A saída para uma nova procura levou-o ao bordel mais próximo e libertou a sua vontade escolhendo as mulheres mais belas e exóticas, arrancando-as dos braços dos outros; a noite foi só dele. A manhã despertou ávida de sol e o homem acordou com ela.



Joana entrou no baile da floresta. Entrou e olhou as árvores seminuas. Os seus olhos, caiados de uma translúcida luz, fecharam-se. O cenário estava destruído. O vento chegara e ficara. O vento despira o seu sonho.
 

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014


Irei partilhar o pouco que sei, como escrevente. Aqui vão ser registados textos que surgiram num convívio de PROET@S. Sem ele não teria sido capaz de voltar a ter o gosto pela magia das palavras.
Obrigada, PROET@S!